quarta-feira, 22 de abril de 2020

agricultura familiar


                    para Luzia Maninha


disposta pela sala
a família
se senta no chão bem no meio da porta
lugar onde corre um arzinho

um lençol grosso de algodão cru
sobre o qual se deita o feijão em bagem
verdinho
lhes cobre até a cintura

o debulhar dá o tom da prosa
à roda
anda o versejar
chuleando cantigas de toda qualidade

os feijões debulhados
vão se aconchegando tranquilos no centro do tecido
satisfeita co’a missão cumprida
a palha se posta de lado

o pai sorri
há enfim o que botar no fogo
a mãe se aquieta
o labor lhes trouxera algum proveito

as crianças sabem
mora ali uma brincadeira diferente demais
e saltam da ingenuidade
à certeza da próxima refeição

foi num foi
um feijãozinho mais afoito toma o rumo
de alguma boca
(entreolhar em regozijo)

só a poesia
numa boquinha de noite
sertaneja
pode dizer o que acontece ali


a boniteza do momento
não cabe no balaio do seo perpétuo
o porvir
é sempre um punhal caprichoso a riscar as faces

de repente
quando dona penúria encostar de novo
encontrará a fortaleza de mãos muito mais grossas
em comunhão


6 comentários:

  1. E começou muito bem esta "lida poética"
    Acho que virei assomar-me mais vezes a esta "janela"
    Abraço
    isa

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  2. Respostas
    1. Agradecido, meu irmão! Aproveite para retomar as atividades no "poesia... pois é... pois vamos!" Um abraço!

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